By: INTERVALO DA NOTICIAS
Texto: UOL – Imagem: Mateus Bonomi (Folhapress)
Há um
ano, o Comitê de Direitos Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas)
acolheu uma petição da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT)
sobre violações que teriam sido cometidas contra o político pelo juiz Sergio
Moro, que julga processos ligados à Operação Lava Jato na primeira instância,
na Justiça Federal no Paraná. Desde então, os advogados de Lula e o governo
brasileiro prestam esclarecimentos ao comitê, que, com base nas respostas,
ainda irá avaliar se deve examinar a questão.
Mas
na avaliação de especialistas em direito internacional consultados pelo UOL,
ainda que a ONU efetivamente discuta o tema e dê um parecer favorável a Lula, a
decisão não terá nenhum efeito penal nas ações em que ele é réu.
"O
efeito prático seria político, um subsídio para ele usar nos processos no
Brasil", explica o advogado José Nantala Badue Freire, para quem uma
análise do comitê positiva a Lula serviria ao ex-presidente para sustentar a
tese de um julgamento político e parcial.
O
advogado Mário de Barros Duarte Garcia pontua que a petição "é uma mera
reclamação de que o Estado estaria violando o direito [de Lula] ter um
julgamento imparcial". "O comitê não tem uma função de fazer um
julgamento efetivo, mas um exame do que foi relatado", complementa.
Professora
de Direito Internacional da USP (Universidade de São Paulo), Maristela Basso
observa que a ida à ONU pode não só ter pouco efeito prático como ainda se
virar contra o próprio presidente. "Ir à ONU pedir um parecer não
acrescenta nada", diz ela. "É uma péssima estratégia. Pode vir um
resultado favorável [à Justiça brasileira]".José Nantala Badue Freite
concorda com a colega: "Pode ser um tiro no pé". "[Mas] é uma
estratégia razoável de se imaginar para alguém com condenação e outros
processos", avalia.
Lula
já foi condenado por Moro a nove anos e seis meses de prisão por corrupção
passiva e lavagem de dinheiro em um processo que envolve um apartamento tríplex
como pagamento de vantagem indevida.
Neste
momento, o ex-presidente observa os últimos movimentos dos defensores antes de
Moro proferir uma nova sentença, dessa vez em uma ação envolvendo um esquema
entre a empreiteira Odebrecht e a Petrobras.
Lula
ainda responde a um terceiro processo, a respeito de um sítio no interior de
São Paulo, que seria pagamento por corrupção na Petrobras. Esta ação penal
ainda está em sua fase inicial, com as partes apresentando a defesa prévia.
A petição
A
defesa de Lula foi à ONU em julho do ano passado, apresentando uma petição ao
comitê. No documento, os advogados dizem que o ex-presidente "é vítima de
abuso de poder por um juiz, com a cumplicidade de procuradores que o atendem e
atuam lado a lado com os meios de comunicação". "Esses abusos não
podem ser satisfatoriamente corrigidos na legislação brasileira",
acreditam os advogados do petista.
Na
época em que a carta foi feita, a principal reclamação dos defensores vinha da
condução coercitiva de Lula, quando ele foi obrigado a prestar depoimento, em 4
de março de 2016. Os advogados pontuaram que a condução só poderia ser realizada
caso "o acusado tenha explicitamente se recusado a depor
anteriormente".
A
defesa diz que Lula nunca se negou a prestar esclarecimentos à Justiça, o que
mostraria ser desnecessária a condução. "Fica bastante claro para um
observador sensato dessas ações que o juiz Moro criou uma animosidade contra
Lula e tem uma opinião formada sobre sua culpabilidade", disseram os
defensores em julho do ano passado.Com 18 membros, o comitê da ONU reúne-se
três vezes por ano. Atualmente, o comitê pede que as partes envolvidas deem
seus argumentos a favor ou contra a petição. Na última reunião do ano passado,
em outubro, houve o pedido para que o governo brasileiro respondesse às
acusações da defesa do ex-presidente.
Um
documento, feito de maneira conjunta por AGU (Advocacia-Geral da União), PGR
(Procuradoria Geral da República) e Itamaraty, foi apresentado no final de
janeiro de 2017. O governo, porém, optou por não dar publicidade ao documento
em que contestou a queixa de Lula.
Tríplex e filme
Em
maio de 2017, a defesa de Lula fez acréscimos a sua petição com base na
resposta do Estado brasileiro. Agora em outubro, mais uma vez a equipe do
ex-presidente fez adendos a sua reclamação. Desta vez, incluiu a sentença do
processo do tríplex, que, na visão dos defensores, contém "violações
grosseiras de Direitos Humanos".
Também
há uma reclamação sobre a presença de Moro na pré-estreia do filme
"Polícia Federal: A Lei É Para Todos", em agosto. A produção
"apresenta o ex-presidente Lula como culpado sem que exista qualquer
decisão definitiva contra ele", avalia a defesa. O governo brasileiro
ainda irá se manifestar ao comitê a respeito das informações dos defensores do
petista.
Ao
UOL, a ONU disse que o caso de Lula não está na agenda do comitê para este ano,
que inicia sua última reunião de 2017 nesta segunda-feira (16). A expectativa é
que uma avaliação sobre a petição do ex-presidente seja feita apenas no ano que
vem, quando o comitê deve dizer se entende que deve analisar a situação. Não
há, porém, uma definição sobre quando isso ocorrerá. A questão também não
aparece na agenda da primeira reunião do comitê em 2018, marcada para março.
Caso
o comitê concorde com as reclamações da defesa de Lula, a ONU pode apresentar
um parecer final, com recomendações para melhorar políticas internas no país,
explica Nantala. "É diferente da Corte Interamericana de Direitos
Humanos", avalia o advogado, que vê esse como o caminho certo que a defesa
de Lula deveria percorrer caso decida recorrer fora do país."[A Corte]
elabora uma sentença, condenando o país membro a tomar algumas medidas para que
os direitos humanos sejam respeitados". Mas isso só aconteceria após os
processos terem chegado à última instância no Brasil, explica Nantala.
Por
esses motivos, Garcia acha difícil que a ONU intervenha. "O Brasil ainda é
considerado um país democrático, com regras conhecidas".
A
reportagem procurou a advogada Valeska Teixeira Martins, que defende o
ex-presidente. Por meio de sua assessoria, ele solicitou que as perguntas
fossem feitas por e-mail. Não houve retorno até a quarta-feira (11).
Em nota divulgada no começo do mês, Valeska disse que
"a sentença proferida pelo Moro como juiz da primeira instância equivale a
uma profecia que se cumpre pelo Moro juiz da investigação", comentou.
"Juntamos a sentença [à petição] para atualizar estas violações ocorridas
desde maio de 2017, quando protocolamos a réplica".
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