sábado, 10 de outubro de 2020

Fim do auxílio emergencial levará 1/3 do país à pobreza, aponta estudo

By: INTERVALO DA NOTICIAS
Texto: BANDA B Imagem: Agência Brasil
Em um cenário considerado otimista, o Brasil ampliará em cerca de 16 milhões o total de pessoas consideradas pobres quando o auxílio emergencial pago aos mais vulneráveis terminar, no final de 2020.
Equivalente à metade da população da Venezuela, esse contingente de “novos pobres” ampliará para quase um terço os brasileiros que passarão a viver com menos de R$ 522,50 ao mês, em média. O valor representa menos de meio salário mínimo e cerca de US$ 3 ao dia.
O pagamento do auxílio emergencial durante a pandemia do coronavírus a mais de 65 milhões de brasileiros reduziu de forma inédita e abrupta a pobreza no país, trazendo-a ao seu menor patamar.
O fim do benefício terá o efeito contrário e rápido. 
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A interrupção dos pagamentos aumentará o total de pobres de 23,6% (50,1 milhões de pessoas) para cerca de 31% (66,2 milhões).
Nesta hipótese mais otimista, considerada muito improvável, o Brasil voltaria, em termos de pobreza, ao mesmo patamar de antes da pandemia, segundo projeções da FGV Social a partir dos microdados da PnadC (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua) e da PNAD Covid, do IBGE.
O cenário não parece factível por dois motivos principais: durante a pandemia, foram os empregos mais precários, sobretudo no setor de serviços, os que mais sofreram por causa do isolamento social; e a renda dos mais pobres já havia sido a mais afetada.
No segundo trimestre deste ano, que pegou totalmente os efeitos do isolamento social e da paralisação econômica, a renda média dos brasileiros caiu 20%. Mas a dos 50% mais pobres despencou 28%.
Quando o auxílio emergencial começou a ser implementado, em abril, milhões de brasileiros tiveram um súbito aumento de renda, o que fez cair rapidamente a taxa de pobreza.
“Enquanto o país vivia numa espécie de inferno trabalhista, abriu-se um céu em termos de melhora na renda”, afirma Marcelo Neri, diretor da FGV Social.
Esse paradoxo vem sendo desmontado desde que o valor do auxílio emergencial foi reduzido de R$ 600 ao mês para R$ 300; e chegará ao fim em dezembro, quando o benefício for interrompido.
Mesmo que o governo Jair Bolsonaro supere as imensas dificuldades que tem se apresentado para criar um programa de ajuda aos mais pobres a partir de 2021, seu substituto deverá ser muito mais modesto que o auxílio emergencial.
Nos cálculos da FGV Social, os valores desembolsados durante os nove meses em que o auxílio terá existido -nas versões de R$ 600 e R$ 300- serão equivalentes a nove anos de orçamento do Bolsa Família.
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“Em qualquer hipótese, os valores de um novo programa de ajuda serão irrisórios em comparação ao auxílio emergencial”, diz Neri.
Assim como ocorreu com sua redução, o aumento da pobreza deve afetar mais as regiões Nordeste e Norte, justamente onde a popularidade de Bolsonaro cresceu com o pagamento do auxílio emergencial.
Para que a pobreza não aumente tanto, a economia e o emprego teriam de passar por uma recuperação muito forte, com impactos positivos sobre a renda, algo fora da maioria das previsões.
A expectativa do mercado é que o PIB (Produto Interno Bruto) em 2021 cresça cerca de 3,5%, numa recuperação que sequer compensará o tombo de 5% previstos para este ano.
Já as previsões para o emprego são bastante pessimistas, com a taxa de desocupação oscilando entre 17% e 19% no início do ano que vem.
No final de 2019, o desemprego estava em 11,9% e, durante a pandemia, aumentou justamente entre os informais e as pessoas de menor renda -mais propensas a engrossar as estatísticas de pobreza.
A partir de 2021, muitas empresas que participaram do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, que permitiu a redução da jornada de trabalho e dos salários, também estarão livres do prazo de carência para realizar demissões -o que dependerá do ritmo da economia.
Para Naercio Menezes, pesquisador do Centro de Gestão e Políticas Públicas do Insper, outra incógnita no mercado de trabalho pós-pandemia é se as mudanças provocadas pelo isolamento social serão estruturais.
O fato de menos pessoas estarem circulando pelas cidades com a massificação do trabalho remoto na pandemia prejudica, por exemplo, uma série de atividade informais, como a de ambulantes; e formais, como a de pessoal de manutenção de edifícios comerciais.
Menezes considera difícil o governo federal não criar algum tipo de auxílio para os mais pobres em 2021. “Não parece razoável que uma parcela significativa dos domicílios no país tenha renda zero. É uma situação muito grave”, diz.
Depois de aventar várias possibilidades, o governo Bolsonaro agora parece ter deixado para depois das eleições, no final de novembro, a definição sobre as fontes de financiamento de um novo Renda Cidadã ou de um Bolsa Família reforçado.
“O nó é que, enquanto a pobreza tende a decolar, o Brasil já gastou quase todo seu ‘combustível’ na pandemia, fechando o ano com uma dívida pública de quase 100% do PIB, o que é muito preocupante”, diz Marcelo Neri, da FGV Social.
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