sábado, 30 de novembro de 2013

Maria da Penha: ainda falta coragem para denunciar



By: INTERVALO DA NOTICIAS
Texto: Edilson Kernicki e Jussara Harmuch (Rádio Najuá) Imagem: Élio Kohut (Intervalo da Noticias/Rádio Najuá)

Foto: Divulgação
Vínculo afetivo-emocional, fator econômico, assédio moral, ameaças e pressão psicológica do agressor contra a vítima são alguns dos motivos para que muitas mulheres ainda hesitem em denunciar seus companheiros, mesmo depois de sete anos de vigência da Lei Maria da Penha, afirma a advogada Vânia Mara Moreira, que atua na cidade de Prudentópolis.
Segundo ela, a agressão verbal é o primeiro obstáculo que impede a mulher de procurar uma delegacia e formalizar a denúncia. Mesmo havendo ao menos um registro diário de Boletim de Ocorrência enquadrado na Lei Maria da Penha em Irati, muitas mulheres deixam de registrar a queixa para prosseguir com o indiciamento do agressor: é o famoso “só queria dar um susto”. Mas a partir de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2012, nos casos de lesão corporal, o inquérito deve seguir sem que seja necessário que a mulher represente contra ele. 
“O homem com quem ela convive pressiona psicologicamente de tal forma que ela se sente impotente. Depois disso, [a dificuldade] é muitas vezes encontrar um profissional ou [sem condição financeira] ter acesso ao Ministério Público (MP) ou a um advogado nomeado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para que ela possa levar, de fato, avante isso”, informa a advogada.

Pressão e assédio
A interferência de outras partes da família – tanto do agressor quanto da vítima – acabam influenciando, ao querer colocar “panos quentes” sobre o assunto. Mesmo depois de feita a denúncia e já com o processo aberto, o agressor acaba exercendo pressão, ainda que nem sempre diretamente. Afastado do lar, ele pode usar o filho como artifício ou envolver outros familiares na tentativa de impedi-la que continue com a ação.
Outro fator é a condição econômica. É comum que maridos agressores tentem convencer as esposas a não denunciá-los sob ameaças de desprovimento financeiro, tentando reforçar a relação de dependência dela. O assédio moral se configura quando o agressor ocupa-se de rebaixar a auto-estima feminina levando a mulher a entender que não conseguiria se sustentar sozinha e não teria capacidade de trabalhar. “Isso é aquilo que eles querem para que a situação continue a mesma”, observa.
Elevação da auto-estima
A depreciação da auto-imagem provocada pela repetição de atitudes agressivas e ofensas verbais tira da mulher a coragem de revelar o caso até mesmo para a própria família. Este ponto é mais evidente entre a classe média e com maior escolaridade. Mulheres de classe social mais simples, de acordo com a advogada, teriam menos pudor de expor seus problemas.
Partindo deste princípio, “um dos primeiros passos para estimular a denúncia de agressão é fazer crescer a auto-estima. Dessa forma, a vítima precisa se colocar realmente no seu papel: o de vítima, não o de culpada, e deixar de se submeter às agressões como se elas fizessem parte do cotidiano familiar”, conceitua Vânia.
Duas situações de personagens da novela global “Amor à Vida” são usadas de exemplo pela advogada para ilustrar o entendimento de como se dá a depreciação da auto-estima. Primeiro, o caso da Valdirene e da mãe Márcia, que vive chamando a filha de burra. “Ouvir isso uma vez não teria problema. Agora ouvir isso a cada duas ou três horas realmente faz com que sua auto-estima caia lá embaixo”. Em outra cena, entre a médica Marilda e o enfermeiro Ivan, os autores da novela expõem os problemas de uma relação sadomasoquista. A mulher sempre aparece com marcas roxas e, quando questionada, mente que sofreu acidentes domésticos. O amante aparece ameaçando-a para que não revele o que ocorre em casa.
A Lei Maria da Penha prevê que as ofensas psicológicas e agressões verbais – o assédio moral – sejam passíveis de penalização. “Existem processos com determinações que estabelecem as mesmas punições dos casos de agressão física”, diz a advogada, que classifica as agressões verbais como bilaterais: podem ser tanto do homem para a mulher, quanto da mulher para o homem. No entanto, ela alerta para o risco dessas agressões verbais evoluírem para uma física, sem chances de a mulher revidar.
“A mulher que tem esses problemas tem dois caminhos: ela precisa conversar com o seu esposo, com o seu companheiro, ver se vale à pena continuar e tentar construir uma vida melhor ou, se não tem condições, tem que procurar se amparar”.
Guarda dos filhos
Algumas mulheres deixam de denunciar por medo de perder a guarda dos filhos ou ficar sem pensão alimentícia. Este tipo de ameaça é muito comum: “A mulher tem que ter um comportamento muito ruim a ponto de o homem poder tirar a criança da mãe. Quando um homem ameaça esse tipo de coisa, já mostra que ele é uma pessoa incapaz de cuidar dos seus filhos”. Denunciar a agressão não fará a mulher perder nenhum direito. “Pelo contrário, elas vão se tornar mais fortes e mais firmes. Serão exemplos para os próprios filhos e família”, defende a advogada Vânia.

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