By: INTERVALO DA NOTICIAS
Texto: UOL
Como pano de fundo da obra prima de Wendell Lira, vencedor do Prêmio Puskas, está o Goianésia, clube até então pouco - ou nada - conhecido que está sob risco de ficar para a posteridade apenas. Um grupo de estudos montado na CBF visa implementar gradativamente, a partir de 2017, o Sistema de Licenciamento de Clubes com o objetivo de padronizar a profissionalização. De acordo com a Federação Nacional de Atletas Profissionais de Futebol (FENAPAF), o país tem 900 clubes que se dizem profissionais, número que, com o caderno de encargos, poderá cair para 250.
"Tem clube que não tem pão com manteiga. Outros cobram
até para o atleta jogar...Com o sistema de licenciamento, não se
enquadrou, está fora. Vai disputar campeonato amador", afirmou o
presidente da FENAPAF e também do Sindicato dos Atletas Profissionais de
São Paulo, Rinaldo Martorelli.
O caderno
exigirá estrutura profissional, o que parece beabá, mas não é. Desde
local de treino, vestiários, médicos, comprovação de receitas,
cumprimento de obrigações trabalhistas, pagamentos de salários, a
participação num calendário anual - atualmente, muitos clubes jogam
menos de um semestre no ano. A CBF quer implantar algumas exigências
para 2017 sem a urgência dos sindicatos. Entre os responsáveis na CBF,
há o temor de que os clubes não consigam se adequar principalmente em
relação ao centro de treinamento e às categorias de base. No ano
passado, a entidade recebeu representantes da Uefa, responsáveis pela
criação das regras na Europa. No Brasil, o grupo de estudo é formado por
representantes das federações, clubes e diretores da CBF.
O excessivo número de clubes dá a sensação de emprego, mas, na verdade,
põe um tapete sobre o porão do futebol brasileiro. Wendel Lira, muito
provavelmente, deixará a base dramática da pirâmide salarial: 85% dos
jogadores recebem até dois salários-mínimos por mês. No topo, estão
2,25% com mais de 20 salários.
"Fiscalizamos
clubes e nos deparamos com cenas inacreditáveis. Clubes sem campo,
jogadores trocando de roupa no gramado por falta de vestiário, sem
receber salários... A realidade do futebol brasileiro é do sonhador que
chega no clube pequeno com 20 anos, peregrina até os 36 anos e deixa o
futebol sem profissão, sem dinheiro, sem rumo. É um sonho mentiroso",
disse o presidente do Sindicato dos atletas Profissionais do Rio de
Janeiro, Alfredo Sampaio.
Ex-jogador de clubes
pequenos, Alfredo sentiu na pele a dificuldade. Mas sem jamais largar o
estudo. Preocupado na mesma medida que indignado, ele encabeça o
projeto de licenciamento. Além da formatação, levou a realidade à CBF,
ao Supremo Tribunal Federal e à Federação de Futebol do Rio de Janeiro.
Uma briga de longa data. Atrás de votos, as entidades abrem a guarda
para receber apoio. A qualquer custo, um clube sem a mínima estrutura
tem poder de voto numa eleição a ponto de ser decisivo. Explica-se em
parte o continuísmo em muitas federações estaduais e até a nacional.
"Falei com o Rubinho (presidente da Federação de Futebol do Rio de
Janeiro). Não pode ir atrás de voto de clube da Série C. Essa competição
não deveria nem existir. O clube não tem médico. É uma vergonha. Na
CBF, a proposta do licenciamento só andou depois da saída do Ricardo
Teixeira... Mostrei em Brasília o que se passa no futebol brasileiro,
longe dos holofotes", afirmou Sampaio.
"Ao
fazer a acrobacia para o golaço, Wendell Lira deu um salto profissional
que muitos sonham. No Brasil, estimam as entidades, apenas 40 clubes são
capazes de abrigar jogadores com dignidade. A equação entre mão de obra
excessiva e pouco qualificada, poucos clubes bons e muitos sem
estrutura é igual a sonho mais futuro nada promissor. O futebol é um
cone ao contrário. Muitos entram, poucos saem", concluiu Alfredo
Sampaio.
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