By: INTERVALO DA NOTICIAS
Texto: Rádio Najuá – Imagem: Divulgação
Os ministérios públicos do Distrito Federal e das cidades de
Apucarana (PR) e Guarapuava (PR) investigam um suposto esquema de
favorecimento em licitações a empresas de transporte público ligadas a
duas famílias – Constantino, que controla a companhia aérea Gol, e
Gulin, do Paraná.
Os estudos de logística e
edital de licitação do transporte público dessas três localidades foram
elaborados pela Logitrans, empresa que tem entre seus sócios os
consultores Garrone Reck e um filho dele, Alex Reck.
Sacha
Reck, um outro filho de Garrone, já defendeu os interesses das famílias
Constantino e Gulin, ligadas aos vencedores das licitações no DF, em
Apucarana e Guarapuava.
Segundo suspeita do MP,
empresas representadas por Sacha Reck são habilitadas e vencem
licitações onde a Logitrans e o escritório do advogado atuam na
elaboração dos editais.
A suspeita é reforçada
em decisão do juiz federal Antonio Claudio Macedo da Silva, que na
última sexta-feira determinou a suspensão de repasses de verbas do BNDES
para as empresas vencedoras da licitação no DF renovarem suas frotas.
"A
empresa Logitrans é contratada para a realização do contrato de
licitação, abordando os aspectos técnicos; o escritório de advocacia
Guilherme Gonçalves & Sacha Reck é contratado como órgão consultor,
sem indicação de procedimento prévio de licitação ou procedimento de
dispensa/inegibilidade de licitação. (...) O escritório de advocacia
Guilherme Gonçalves & Sacha Reck controla o procedimento de
habilitação e inabilitação dos concorrentes. Empresas que anteriormente
celebram contratos advocatícios com o escritório de advocacia Guilherme
Gonçalves & Sacha Reck sagram-se vencedoras, apresentando propostas
de alto valor", diz trecho da decisão.
Diante dos indícios de irregularidades na licitação do Distrito
Federal, o Ministério Público do DF pediu à Justiça, no dia 6 de
dezembro, a suspensão dos contratos firmados entre o governo e as
empresas de ônibus vencedoras da concorrência. Ainda não houve decisão
judicial.
Por e-mail, Garrone Reck, disse que o
filho dele atuou como membro da equipe da Logitrans na elaboração dos
estudos de mobilidade urbana e editais de licitação apenas no processo
de licitação do Distrito Federal. Ele afirmou que a atuação da
Logitrans no DF se encerrou antes da abertura do processo licitatório.
Garrone
Reck afirma ainda que em nenhuma das cidades “houve a coincidência de a
Logitrans atuar como assessora do poder público e Sacha Reck,
simultaneamente, como assessor de empresas licitantes”. “Sacha Reck não é
sócio da Logitrans. Ele tem seu escritório de advocacia que é
independente e não possui qualquer submissão ou ligação societária com a
empresa Logitrans.”
O pai do advogado declarou
também desconhecer a atuação do filho em ações judiciais em nomne da
Piracicabana e Marechal “ou de qualquer outra empresa que tenha
participado da licitação do Distrito Federal”.
Também
por e-mail, Sacha Reck disse que sua participação na licitação do DF
não foi irregular. “O fato de meu irmão e meu pai serem sócios da
empresa Logitrans, que presta consultoria no setor de transportes, não
pode me impedir de advogar para empresas de transporte coletivo. Isso
seria uma afronta ao direito constitucional ao livre exercício da
profissão.”
Sacha Reck nega também que já tenha
prestado serviços a companhias que disputaram licitação onde a empresa
do pai e do irmão atua. “Vou repetir: Não há nenhum caso em que a
Logitrans preste consultoria a um órgão licitante e eu seja advogado de
uma empresa privada que participe da licitação. Isso nunca aconteceu”,
disse.
Triangulação no DF
Mas
no Distrito Federal duas empresas ligadas aos Constantino – viações
Piracicabana e Pioneira – venceram a licitação do transporte público,
finalizada no final do ano passado. Interesses dos sócios das duas
empresas já foram representados por Sacha Reck em ações de outras
empresas da família Constantino. A Viação Piracicabana ganhou a
licitação com o valor máximo de tarifa prevista para o lote ofertado –
R$ 2,6555.
Sacha Reck atuou como consultor na
elaboração do edital do transporte coletivo do DF, conforme documentos
oficiais e informações do secretário de Transportes do DF, José Walter
Vazquez. A licitação dividiu o DF em cinco áreas (ou bacias). Cada área
foi vencida por uma empresa.
O secretário de
Transportes disse que Reck foi contratado pelo governo do DF para
orientar a produção do certame porque é uma "referência" na área. "Se
houve alguma irregularidade, quem deve responder por isso é o Sacha
Reck", afirmou Vazquez.
Sacha Reck negou ao G1
irregularidades na sua atuação na produção dos estudos de mobilidade que
deram subsídios ao governo do Distrito Federal para a elaboração do
edital.
“No Distrito Federal, minha atuação
teve início num contrato firmado entre o BID (Banco Interamericano do
Desenvolvimento) e o Consórcio Logit-Logitrans. Eu era membro do quadro
de consultores desse consórcio. A minha atuação como consultor na
licitação do Distrito Federal foi legítima e regular.”
Segundo
o advogado, as suspeitas lançadas sobre sua atuação no processo de
licitação “nada mais são do que fruto do desespero e inconformismo de
empresas locais que não se sagraram vencedoras do certame”.
Marília, Curitiba, Manaus...
Sacha
Reck, no entanto, confirmou já ter trabalhado para empresas ligadas às
duas famílias em um processo de licitação na cidade de Marília, no
interior paulista. “Eu já advoguei, individualmente, para a empresa
Viação Cidade Sorriso Ltda, que tem em seu quadro de sócios pessoas
físicas de sobrenome Gulin", disse. "E já advoguei, individualmente,
para a empresa Transportes Coletivos Grande Bauru, que tem como sócios
algumas pessoas de sobrenome Constantino”.
A licitação ocorreu em novembro de 2011, mas a disputa entre as
empresas vencedoras da licitação e as que perderam a disputa ainda é
alvo de disputa judicial.
“Inicialmente, eu fui
contratado para assessorar a empresa Viação Cidade Sorriso Ltda [ligada
à família Gulin]”, disse Reck. “Após a conclusão da licitação sagrou-se
vencedora Sorriso, no lote 2, e a Transportes Coletivos Grande Bauru
[controlada pela família Constantino] no lote 1, ambas por terem
oferecido a menor tarifa entre diversos concorrentes.”
Sacha
Reck defendeu ainda a Viação Marechal, também ligada à família Gulin,
em ações em Curitiba, conforme procuração de 14 de novembro de 2012
obtida pelo G1. A Marechal venceu um dos lotes da licitação no DF,
também com o valor máximo previsto para a tarifa técnica – de R$ 2,7192.
O
advogado, por sua vez, negou ter atuado como advogado da Marechal. “A
procuração que recebi da referida empresa se refere a uma ação coletiva
do Sindicato das Empresas de Transporte Urbano e Metropolitano de
Curitiba e Região Metropolitana (Setransp), de quem sou advogado. Tenho
contrato de prestação de serviços exclusivamente com este sindicato,
para tratar de assuntos coletivos envolvendo apenas as concessões do
transporte coletivo de Curitiba. Nos termos desse contrato, não está
incluída advocacia individual para as empresas filiadas ao Setransp/PR.”
O sindicato é presidido por Dante José Gulin.
Reck
também defende interesses da família Constantino em ações da Transdata
em Manaus, empresa que também opera o sistema de bilhetagem no DF. Em
depoimento ao Ministério Público do Paraná, Sacha Reck confirmou já ter
atuado para outras empresas da família Constantino – Viação Umuarama,
Pássaro Verde, Transporte Urbano Intermunicipal (Turi), Expresso
Valônia, Viação Varginha, Via Sul Transportes, Auto Ônibus Botucatu e
Grande Bauru.
O G1 entrou em contato com as
empresas Comporte, ligada ao grupo Constantino, e Gulin, para comentar o
assunto, mas não obteve resposta das companhias até a publicação desta
reportagem.
Mais cidades
A
triangulação entre Logitrans, Sacha Reck e empresas do grupo
Constantino ou Gulin ocorre em pelo menos outras 11 cidades, conforme
apuração do G1.
Em Guarapuava (PR), Sacha Reck e
as empresas Transportes Coletivos Pérola do Oeste e Viação Marechal,
ambas controladas pela família Gulin, são alvos de uma ação por
improbidade administrativa na 1ª Vara Civil da cidade.
A
Logitrans elaborou o edital de licitação para exploração do transporte
público na cidade em 2009. A vencedora do certame, em dezembro daquele
ano, foi a Transportes Coletivos Pérola do Oeste, que passou a receber
com a exploração do serviço R$ 1,35 milhão por mês, conforme informações
da prefeitura da cidade.
A empresa teve interesses judiciais representados por Sacha Reck
durante o certame, conforme informações do Ministério Público do Paraná,
e contratou a Logitrans em 2012 para elaborar um novo plano de
mobilidade urbana. A única concorrente na licitação era a Viação
Marechal.
Em agosto de 2013, o juiz Antônio
Carvalho Filho, da 1ª Vara Civil de Guarapuava, determinou a
indisponibilidade dos bens e quebra dos sigilos bancário e fiscal das
duas empresas, de Sacha Reck e dos sócios da Logitrans. Para o
magistrado, há indícios de um "verdadeiro conluio familiar e societário
para favorecer a vencedora do certame".
"O
senhor Sacha Reck, irmão e filho dos sócios Alex Reck e Garrone Reck, da
requerida Logitrans, foi o representante da requerida Transportes
Pérola do Oeste por ocasião da licitação, o que, no mínimo aparenta
íntima ligação entre as empresas", argumentou o juiz.
Em
Apucarana, o Ministério Público conseguiu suspender, em março de 2012,
uma licitação ao suspeitar das relações entre Logitrans, Sacha Reck e
uma empresa ligada à família Constantino que participava do certame. As
empresas Viação São Francisco e Auto Ônibus Botucatu disputavam a
concorrência, cujo edital foi elaborado pela Logitrans.
A
Auto Ônibus Botucatu foi assessorada por Sacha Reck em ações judiciais
em Apucarana e em Marília (SP), conforme procurações obtidas pelo G1 e
declaração feita pelo próprio advogado ao Ministério Público do Paraná.
Em
Cascavel (PR), o último estudo de mobilidade urbana foi concluído em
2010 pela Logitrans, que recebeu R$ 118 mil da prefeitura da cidade. Em
2011, as empresas Viação Capital do Oeste e a Pioneira de Transportes
tiveram contratos renovados para a exploração do serviço de ônibus. A
Pioneira de Transportes é formada por uma sociedade entre a família
Gulin e Pedro Constantino, de acordo com informações na página da
empresa na internet.
Em Maringá, a Logitrans
recebeu R$ 139,6 mil da prefeitura para elaborar o edital de licitação,
em 2011. A vencedora do certame, com contrato assinado em junho daquele
ano, foi a TCCC – Transportes Coletivos Cidade Canção, empresa de Pedro
Constantino e Paulo Constantino. A empresa recebe em média R$ 5 milhões
por mês com a exploração do serviço, segundo a prefeitura da cidade.
Em
Foz do Iguaçu (PR), a Logitrans elaborou estudo de mobilidade urbana em
2010, e a vencedora da concorrência foi o Consórcio Sorriso, do Grupo
Gulin. A empresa foi representada diretamente por Sacha Reck em ações no
Paraná.
Em Cambé, a Logitrans foi contratada
para elaborar edital e estudo de mobilidade urbana em 2007. A empresa
Til Transportes Coletivos, ligada aos Constantinos, tinha contrato para
exploração do serviço de transporte público na cidade até 2001. Apesar
do término do contrato, a empresa continua atuando com autorização do
município, mesmo após o estudo de mobilidade urbana de 2007, que deveria
ensejar nova concorrência.
Já em Londrina
(PR), a Logitrans elaborou plano de transporte público em 2007,
contratada pelo governo do estado do Paraná, conforme informações
existentes no site da própria empresa. A empresa contratada para atuar
na cidade é a TCGL, pertencente ao Grupo Constantino.
Em
Jaguariaíva (PR), a Logitrans foi contratada em 2010 pela prefeitura da
cidade para elaborar estudo de transporte público. A empresa que
explora o serviço é a Princesa do Norte, de propriedade do Grupo
Constantino.
Em Ponta Grossa (PR), a Logitrans
elaborou plano de transporte municipal em 2005, contratada pela
prefeitura. A empresa que explora serviço de ônibus na cidade é a Viação
Campos Gerais, do Grupo Gulin.
Nas cidades
paulistas que contrataram a Logitrans, a vitória nas concorrências
públicas também foi de empresas ligadas a um dos dois grupos
empresariais.
Em São José do Rio Preto (SP), a
Logitrans elaborou projeto de mobilidade urbana em 2012. Uma das
empresas que operam na cidade é a Expresso Itamarati, também de
propriedade da família Constantino.
Situação
parecida ocorreu em Rio Claro (SP). A Logitrans elaborou estudo de
mobilidade em 2004. Em 2011, outra empresa fez o edital e a vencedora
foi a Rápido São Paulo, do grupo Constantino.
"O
atual contrato da empresa Rápido São Paulo para operar o transporte
coletivo no município de Rio Claro é de dezembro de 2011, oriundo de
processo licitatório específico, que não teve participação da empresa
Logitrans", disse a prefeitura.
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