By: INTERVALO DA NOTICIAS
Texto: G1 – Imagem: Divulgação
Mas também despertou dúvidas sobre a vacina, a infecção sexualmente
transmissível e a pesquisa em si, que consolidou resultados positivos
que já vinham sendo percebidos por médicos e especialistas.
Afinal, o que é exatamente esse vírus, quais são os sintomas e como se
proteger? Como é o tratamento? Homens também são afetados? Quem tem
direito à vacina no Brasil?
Essas e outras perguntas serão respondidas abaixo pela reportagem. Mas, primeiro, vamos ao estudo.
Na pesquisa, feita na Inglaterra com dados de mulheres de 20 a 64 anos
coletados entre 2006 e 2019, foram analisados os impactos do imunizante
entre vacinadas e não vacinadas contra o HPV.
Isso foi feito a partir dos diagnósticos do câncer de colo de útero ou
cervical entre as participantes ou detecções de alterações anormais de
células do colo do útero que podem indicar uma espécie de fase
pré-câncer, chamadas de neoplasia intraepitelial cervical (ou NIC3).
Ficou evidente para os pesquisadores a significativa redução dos dois
indicadores após o início do programa de imunização contra o HPV, em
2008.
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Os dados da pesquisa apontaram que essa faixa etária está ligada à
maior eficácia da vacina porque as garotas nessa idade tiveram pouca ou
nenhuma exposição prévia ao HPV, transmitido principalmente pela via
sexual.
Mas qual é a relação entre HPV e câncer de colo de útero, quarto tipo de câncer que mais mata mulheres no Brasil?
"Pode-se dizer que ele é 100% associado ao HPV", resume Agnaldo Lopes,
presidente da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e
Obstetrícia (Febrasgo), em entrevista à BBC News Brasil.
Por ano, mais de 16 mil brasileiras são diagnosticadas com essa doença no Brasil, e cerca de 7 mil acabam morrendo.
No mundo, são 342 mil mortes por ano, sendo 90% delas em países de
renda baixa e média, segundo a Agência Internacional de Pesquisa sobre o
Câncer.
Vale lembrar que o HPV é comum, bastante prevalente na população em
geral. Segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca), estima-se que pelo
menos 80% das mulheres e dos homens sexualmente ativos serão infectados
por um ou mais tipos desse vírus em algum momento da vida.
Em 2017, um estudo do Ministério da Saúde apontou que metade dos jovens
brasileiros tinham HPV — que é considerado o segundo maior agente
causador de câncer nos humanos, atrás apenas do tabaco.
Por isso, a vacina é fundamental para mulheres e homens por ajudar a
evitar tanto a infecção e a transmissão do vírus quanto o surgimento das
lesões que podem se tornar câncer.
Mas a baixa adesão à vacinação contra HPV no Brasil, recomendada
principalmente para mulheres de 9 a 45 anos (exceto grávidas) e homens
de 9 a 26 anos, indica que esse problema de saúde ainda está bem longe
do fim.
Como se contrai o HPV e quais são os sintomas?
HPV (sigla em inglês para papilomavírus humano) é um conjunto de vírus
que podem infectar a pele e a mucosa de algumas partes do corpo feminino
e masculino, como vulva, vagina, colo do útero, pênis e região
perianal.
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Dois tipos de HPV, 16 e 18, são responsáveis por cerca de 70% dos cânceres cervicais e lesões cervicais pré-cancerosas.
Já os tipos 6 e 11, apesar de não oncogênicos, aparecem em 90% das lesões (como papilomas laríngeos e condilomas genitais).
Os tipos de HPV de alto risco de virar câncer podem levar ao
aparecimento de lesões de alto grau, mas a doença pode ser prevenida em
praticamente todos os casos se essas lesões forem identificadas e
tratadas de forma precoce.
Tanto as lesões pré-cancerosas quanto o câncer em estágio inicial podem
não apresentar sintomas, mas, com o avanço da doença, pode haver
sangramento, corrimento e dor.
Essas infecções costumam ser transitórias, com regressão natural na
maioria das vezes, especialmente entre mulheres com menos de 30 anos.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), as infecções por HPV
podem desaparecer graças ao próprio sistema imunológico, sem nenhuma
intervenção externa alguns meses após contrair o vírus, sendo que quase
90% delas somem dentro de 2 anos.
Mas fatores como imunidade, genética e comportamento sexual podem ampliar os riscos de transmissão e persistência da infecção.
"O problema está nas infecções persistentes, que têm a ver com sistema
imune. Toda imunossupressão, como por exemplo os pacientes portadores do
HIV, transplantados renais, quem faz uso de corticoide ou mesmo
cigarro, está associado a uma diminuição da imunidade, e aumentam as
chances de problemas com o HPV. Eles podem e devem ser vacinados, porque
o vírus é mais grave nesses pacientes", afirma Lopes, da Febrasgo.
O sexo é considerado a principal via de infecção, mas isso pode ocorrer
também pelo contato direto com a pele ou a mucosa infectada.
Geralmente, as regiões afetadas no corpo feminino são: vagina, vulva,
colo do útero, região pubiana e perianal, boca e garganta. Nos homens,
podem ser atingidos: pênis, bolsa escrotal (onde estão os testículos),
região pubiana, perianal, boca e garganta.
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Mas, no caso da presença de lesões, estas identificadas de duas formas: clínica e subclínica.
A primeira trata-se das manifestações visíveis, como as verrugas
conhecidas popularmente como "crista de galo" (condilomas acuminados),
que podem ter diferentes tamanhos, extensões e localizações.
O diagnóstico é geralmente feito durante exame clínico em consulta com ginecologistas, urologistas e proctologistas.
A segunda categoria, subclínica, demanda exames laboratoriais como
citopatológico, histopatológico e biologia molecular (que detecta a
presença do DNA do vírus).
Outras possibilidades são as lentes de aumento que ajudam a visualizar
melhor as partes afetadas ou a aplicação de reagentes químicos de
contraste como peniscopia, colposcopia e anuscopia. Tudo sempre feito
por profissionais especializados.
Das lesões ao câncer: como funciona a prevenção
Lopes afirma que, geralmente, leva cerca de dez anos para a lesão
pré-cancerosa virar um câncer, e o aparecimento de sintomas costuma
indicar uma fase avançada da doença. Mas como se dá esse caminho e como
evitá-lo?
Tania Petraglia, pediatra e secretária do Departamento Científico de
Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), explica:
"Primeiro você não visualiza nada. Há uma lesão começando no colo do
útero, e a mulher não sente nada, não tem uma leucorreia (conhecida como
corrimento). Mas a célula está lá sofrendo transformação. E por isso
também é preciso fazer o exame preventivo periódico, para identificar
células que estejam nessa transição para a malignidade. Ela não se torna
maligna do dia para noite. É uma evolução de anos. E, ao longo do tempo
,é possível encontrar atipias celulares, que são alterações das
características das células".
Segundo Lopes, o HPV não se resume ao câncer de colo de útero. "Ele
também está associado a outros tipos de cânceres como o câncer de vulva,
vagina, pênis, cabeça, pescoço, ânus".
Homens e mulheres podem se prevenir desta e outras infecções
sexualmente transmissíveis (ISTs) usando preservativo durante o sexo,
pois ele diminui a área de exposição. Mas a transmissão pode ocorrer
mesmo sem penetração vaginal ou anal.
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"Para a transmissão do HPV, você não precisa ter a consumação do ato
sexual. O contato é pele a pele, e a transmissão é alta", diz Petraglia,
da Sociedade Brasileira de Pediatria.
Ou seja, a utilização do preservativo continua essencial, mas a
camisinha masculina ou feminina são incapazes de cobrir todas as partes
do corpo que podem ser infectadas.
Por isso a vacina contra o HPV se mostra tão importante, principalmente antes do início da vida sexual.
A Sociedade Brasileira de Pediatria, a Sociedade Brasileira de
Imunizações (SBIm) e a Febrasgo recomendam a vacinação de mulheres de 9 a
45 anos e homens de 9 a 26 anos, e de 9 a 26 anos para pessoas com HIV e
para pacientes oncológicos ou transplantados.
Outro pilar da prevenção é a realização dos chamados exames de rotina
ou preventivos, como o papanicolau, que podem detectar infecções e
lesões antes que elas se agravem.
No Brasil, é possível realizar gratuitamente exames preventivos de
câncer do colo do útero nas unidades do Sistema Único de Saúde (SUS),
incluindo os postos de coleta de exames preventivos ginecológicos
gratuitos presentes em todos os Estados brasileiros.
Segundo o Inca, não há tratamento para eliminação do vírus em si. Mas
há formas de lidar com as lesões, por exemplo, como laser,
eletrocauterização e remédios. Tudo a ser definido caso a caso por um
profissional.
Quem deve se vacinar contra HPV e onde está disponível? Há duas vacinas disponíveis contra o HPV no Brasil, ambas aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
A bivalente (os dois tipos de HPV de alto risco: 16 e 18) e a
quadrivalente (para dois tipos de baixo risco e dois de alto risco: 6,
11, 16 e 18). A vacina é feita com o vírus inativado e, portanto, não
tem como causar a doença.
Em 2014, o Ministério da Saúde brasileiro adicionou ao Calendário
Nacional de Vacinação a vacina quadrivalente, que ajuda a prevenir
quatro tipos de HPV e proteger o organismo de lesões pré-cancerosas no
colo de útero, na vulva e na vagina e do câncer do colo do útero.
Esse imunizante é oferecido gratuitamente no SUS em duas doses (com
intervalo de seis meses entre elas) para todas as garotas de 9 a 14 anos
e todos os garotos de 11 a 14 anos.
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A Anvisa aprovou o uso da vacina quadrivalente para mulheres de 9 a 45
anos e homens entre 9 e 26 anos, e o uso da vacina bivalente para
mulheres entre 10 e 25 anos.
Em clínicas particulares, duas doses da vacina bivalente custam ao todo
R$ 400, em média; as da quadrivalente totalizam R$ 600, em média.
Especialistas e estudos apontam que a eficácia da vacina será maior
antes de qualquer contato com o HPV, e essa proteção será inversamente
proporcional à idade e à exposição ao vírus.
Ou seja, quanto mais velho e mais contato com o vírus, menos eficaz
será o imunizante no momento da aplicação na pessoa, ressalta Petraglia.
"O ideal mesmo é que toda população sexualmente ativa, homens e mulheres, se vacine contra o HPV", recomenda Lopes.
Valentino Magno, ginecologista oncologista e professor da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), ressalta a importância da vacina
mesmo entre quem não está mais na adolescência.
"É possível se contaminar por mais de um tipo de HPV, e isso é comum.
Por isso que a única vacina disponível no Brasil contempla os principais
tipos, os 6 e 11, que causam mais de 90% das verrugas genitais e o 16 e
18 que são os principais causadores das lesões pré-câncer e câncer do
colo do útero, vulva, vagina, canal anal e pênis."
Baixa adesão e cobertura da vacina contra HPV no Brasil
Mas, como ocorre com a vacinação contra outras doenças no Brasil, a
imunização contra o HPV está abaixo do patamar almejado pelo Ministério
da Saúde.
Segundo dados compilados pela SBIm, em 2020, a primeira dose da vacina
HPV, cuja meta é de 80%, foi aplicada em cerca de 70% das meninas de 9 a
15 anos e em pouco mais de 40% dos meninos de 11 a 14 anos. Na segunda
dose, os índices foram de aproximadamente 40% e 30%.
A vacinação contra HPV enfrenta obstáculos semelhantes à imunização
contra outras doenças, incluindo notícias falsas. E a situação se
complica ainda nesse caso porque envolve adolescentes e questões
sexuais.
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"É difícil adolescente ir ao médico. É difícil adolescente se vacinar. É
uma questão do adolescente com a saúde. A vacinação na escola para essa
faixa etária seria uma estratégia excepcional para melhorar essa
adesão. Falta aos municípios, lá na ponta do sistema de saúde,
perceberem que medidas muito simples podem aumentar a adesão", diz
Petraglia.
Ela defende também outras estratégias, como o programa Saúde na
Família, com a capilaridade dos agentes de saúde presentes em
comunidades.
A vacinação contra HPV chegou a acontecer em parte das escolas há
alguns anos, ajudando a manter a cobertura vacinal em um patamar
elevado, mas atualmente o programa está concentrado nas unidades básicas
de saúde.
Há outros obstáculos para essa faixa etária, segundo especialistas,
como os pais não levarem os adolescentes para se imunizar tanto quanto
fazem com filhos ainda crianças, a falta de campanhas de conscientização
dos jovens, a circulação de informações falsas por redes sociais e a
moralidade em torno do HPV por causa da questão sexual.
"Tem uma conotação errônea para isso como se, por ser um vírus de
transmissão sexual, se está estimulando a vida sexual. Não faz sentido.
Isso prejudica ainda mais a aceitação da vacina. Faltam campanhas de
conscientização", afirma Lopes.
Para ele, "é uma vergonha sobrar vacina em um país com uma prevalência de câncer de colo tão elevada".
Além disso tudo, a pandemia de covid-19 também afetou programas de
imunização e a cobertura vacinal contra diversos patógenos, incluindo o
HPV.
Vacina contra HPV para grávidas
Há apenas três grupos que não se recomenda tomar a vacina contra HPV:
quem apresentou anafilaxia na primeira dose dessa vacina, quem tem
alergia a alguns dos componentes do imunizante e quem está grávida.
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São feitos exames preventivos, como o papanicolau, e a via de parto
definida (natural ou cesárea) continua a mesma, exceto se houver
verrugas (condilomas) muito grandes no canal do parto. Nesse caso,
haveria risco de sangramento.
"Como na gravidez a imunidade está diminuída, algumas lesões de HPV
podem aparecer nessa fase. Então, uma paciente pode ter algum HPV que
está quieto, e durante o processo normal de baixar a imunidade, aparecer
alguma lesão de HPV. Por isso, no acompanhamento de pré-natal também é
avaliado o colo do útero", explica o ginecologista.
Lopes aponta ainda que pode haver uma transmissão da mãe para a laringe do recém-nascido, a papilomatose laríngea recorrente.
E no caso de câncer? Ele explica que o câncer de colo de útero é
incomum em grávidas e a gravidez acaba servindo de janela de
oportunidade para um diagnóstico porque as mulheres podem fazer exames
que não costumam realizar.
Mas, se houver câncer, há tratamento durante a própria gravidez, e não se interrompe mais a gestação, como no passado.
"Se é um câncer inicial, acompanhamos, se for um câncer mais avançado,
esperamos passar o primeiro trimestre, o começo da gravidez e a formação
do bebê. Alguns médicos fazem até quimioterapia durante a gravidez, e
fazem o tratamento definitivo depois que o bebê nascer", explica Lopes.
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