By: INTERVALO DA NOTICIAS
Texto: EXTRA – Imagem: Marcelo Theobald
“Patrão, tem paparazzo lá embaixo?”. Maria Angélica Lima, de
45 anos, nunca achou que teria esse tipo de preocupação. Era para ser
um domingo como qualquer outro do último ano, em que trabalhou cuidando,
aos fins de semana, dos gêmeos de um morador de Ipanema. Mas uma foto,
a caminho das manifestações de Copacabana neste domingo, a colocou no
centro dos debates. E a repercussão assustou.
— Me senti exposta — explica. — Acordei e vi minha cara no jornal. Foi um susto.
A imagem mostra Angélica empurrando o carrinho de bebês com os filhos
dos patrões, que estão ao lado. Moradora de Nova Iguaçu, ela estudou
até o ensino médio. O serviço era para desafogar as contas da casa onde
vive com o marido e as filhas, de 2 e 16 anos. Mesmo assim, a crise
sufocou.
— O pobre é que sofre. O preço da comida aumentou muito. Íamos reformar a casa, mas não vai dar — conta.
A solução, para a babá, não passa por tirar a presidente Dilma
Rousseff do cargo da presidência. Não acredita no vice, Michel Temer
(PMDB). Para ela, “nenhum deles presta”. Nas eleições de 2014, Angélica
votou duas vezes em Aécio Neves (PSDB). Ela diz que acredita nas
propostas do mineiro. A babá também admira a figura do juiz Sérgio Moro,
que já condenou 67 pessoas na Operação Lava Jato.
— A solução do Brasil começa por mudar o Congresso todo — sonha Angélica.
O furacão que transformou a babá em ponto de discussão nas redes
sociais tem origem, segundo o cientista política Paulo Baia, da
Universidade Federal do Rio de Janeiro, na polarização dos debates sobre
os atos contra a presidente.
— De um lado, há os que são a favor
de Dilma e vão dizer que há discriminação ali, porque é uma negra numa
manifestação onde só vai rico — pontua Baia. — O outro lado diz o
inverso. Afirma que a imagem é de uma família bem-sucedida, lutando
contra a corrupção, que contrata legalmente. Esse é o foco da briga.
Confira a entrevista com a babá Angélica
O que você achou de ir à manifestação de anteontem?
Eu
não estava fazendo nada demais. Estava no meu horário de trabalho,
cumprindo a minha função. Ele, como meu patrão, estava indo à
manifestação. E eu estava indo com eles para acompanhar as crianças. Eu
tenho que estar perto. E só. Mais nada.
A senhora foi obrigada?
Não. Claro que não.
Iria se estivesse de folga?
Eu iria se tivesse
morando lá embaixo (na cidade do Rio). Ir daqui (Nova Iguaçu) para lá é
bem difícil. Pego dois ônibus para ir trabalhar.
Você é a favor dos atos?
Sou.
Mas queria que isso tudo acontecesse, e tivesse resultado. Falei para o
meu patrão: “As pessoas querem o impeachment e que as coisas mudem, mas
não vai mudar”. A presidente Dilma saindo, quem entrar vai continuar
roubando. O Brasil é assim. Quem está com dinheiro, como os políticos,
vai continuar tudo bem. A gente que vai sempre levar a pior.
Por que votou no Aécio?
O
Lula não foi aquele presidente que todo mundo esperava. Aí, votei no
Aécio para dar uma oportunidade de que ele mudasse o quadro. Mas entrou a
Dilma e a gente está vendo esse resultado.
Você trabalha na semana?
Não. Quero curtir a infância da minha filha mais nova.
Quem cuida das suas filhas quando está no trabalho?
Meu
marido trabalha às vezes no fim de semana. Então, a gente contrata uma
menina, que mora aqui perto, para tomar conta da menorzinha.
O que acha de usar uniforme?
Acho
que é um dever que a gente tem. Desde o momento que a gente trabalha e
tem uniforme, a gente tem de usar. Tem casas que não pedem, outras
precisam. Eu acho até melhor porque preserva mais as nossas roupas. E
tudo eles que dão. Eles dão sapato, calça, bermuda, blusa. Minha patroa
que fornece.
Como a senhora soube de que estava nas redes?
Meu
patrão que me mostrou. Ele disse: “Olha, Angélica, está acontecendo uma
coisa chata”. E me explicou o que era. Eu falei: “Sinceramente, seu
Cláudio, eu não estou nem entendendo nada disso”.
Gostaria de falar algo a quem debateu nas redes sociais?
Não
fiquem preocupados. Quem me apoiou, sabe do valor da gente, que é babá,
de trabalhar, de ter nosso dinheiro. A gente tem de dar valor ao
trabalho, independente de usar de uniforme ou não.
Polêmica na rede
Muitos
internautas enxergaram na imagem um retrato da desigualdade social do
país. Já outros apontaram para uma simbologia das condições de
subemprego a que algumas empregadas domésticas estão submetidas.
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