By: INTERVALO DA NOTICIAS
Texto: RPC – Imagem: G1
O ex-diretor da Secretaria de Educação do Paraná Maurício Fanini afirma
ter intermediado pagamentos de propina para o ex-governador Beto Richa (PSDB) entre os anos de 2002 e 2015.
As declarações foram documentadas em uma proposta de colaboração
premiada feita à Procuradoria-Geral da República (PGR) em dez anexos,
obtida com exclusividade pela RPC e pelo G1. Até esta terça-feira (5), o acordo ainda não havia sido fechado.
Segundo o ex-diretor, o dinheiro abasteceu as campanhas de Richa para a
Prefeitura de Curitiba e para o Governo do Paraná, além de bancar
gastos pessoais como viagens e a compra de um apartamento para o filho
mais velho de Beto Richa, Marcello Richa.
Richa nega tudo e fala em "manobra arquitetada às vésperas do período eleitoral". Veja a nota completa do ex-governador mais abaixo.
Fanini foi preso duas vezes pela Operação Quadro Negro, que investiga
desvios de verbas que deveriam ser usadas na construção e reforma de
escolas estaduais. A estimativa do Ministério Público do Paraná (MP-PR) é
a de que a fraude tenha ultrapassado o montante de R$ 20 milhões.
Réu em três ações criminais relacionadas à operação, Fanini está detido na carceragem da Polícia Federal (PF) em Brasília desde maio deste ano.
O começo
Maurício Fanini diz que Beto Richa passou a cobrar propina em 2001,
quando era vice-prefeito da capital paranaense. À época, Fanini era
diretor de Pavimentação de Curitiba, indicado por Richa, de quem diz ter
se tornado amigo muito próximo desde a faculdade de engenharia, em
1983.
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A primeira oferta de propina a Richa, afirma o ex-diretor, foi feita
por Eron Cunha, dono da construtora Empo, por meio de um aditivo
indevido de R$ 100 mil em uma obra de pavimentação no bairro curitibano
do Cajuru, ainda em 2001.
Após ser apresentado a Eron durante uma viagem a Foz do Iguaçu, Richa
negociou a propina e acertou que o dinheiro seria entregue em espécie
para seu chefe de gabinete à época, Ezequias Moreira, conta Fanini.
No entanto, o pagamento não foi concretizado porque o aditivo foi
reprovado pelo secretário de Obras da época, Carlos Scalco, cuja postura
era “rígida e ética”, conforme o ex-diretor.
Primeiros repasses
Maurício Fanini afirma que Beto Richa passou efetivamente a abastecer
campanhas eleitorais com dinheiro de caixa 2, em 2002, quando concorreu
pela primeira vez ao governo estadual e perdeu para Roberto Requião
(PMDB).
O dinheiro partia de empresários, por meio de aditivos e percentuais de
contratos com a Prefeitura de Curitiba. Conforme o relato, o
recebimento era sempre negociado por Ezequias Moreira e Luiz Abi, primo
de Beto Richa.
O ex-diretor diz que, com a derrota, diante de muitas dívidas, Richa
ordenou, por meio de Abi, que fosse arrecadado mais dinheiro, com
urgência. Sem conseguir atender à exigência, Fanini afirma que foi
exonerado da Secretaria de Obras, em maio de 2003.
Fanini conta que, dois meses depois, ao ser chamado à festa de
aniversário de um dos filhos de Richa e ouvir do amigo o pedido para
esquecer os problemas passados, passou a arrecadar mais propina, agora
para a campanha de Beto à Prefeitura de Curitiba, em 2004.
Segundo Fanini, Beto Richa seguiu recebendo arrecadações de empresários
durante o mandato na prefeitura, entre os anos de 2005 e 2011, até a
eleição ao Governo do Paraná.
Governo do Paraná
Em 2012, com a eleição de Richa ao governo, Fanini ganhou um cargo na
Secretaria Estadual de Educação. No mesmo ano, conforme o relato, houve a
primeira conversa entre ele e Beto Richa sobre doações de campanhas
enquanto governador.
Chamado à Granja do Canguiri, a residência oficial do governo do
estado, em Pinhais, Região Metropolitana de Curitiba, Maurício Fanini
afirma que foi questionado por Richa sobre a possibilidade de arrecadar
dinheiro de empresas para a campanha de reeleição de Luciano Ducci à
Prefeitura de Curitiba, ainda em 2012.
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Segundo Fanini, Richa disse, com muita naturalidade, que deveria ser
feita uma arrecadação mensal com prestação de contas exclusivamente para
o governador. Disse também ter ouvido de Richa que ele poderia separar
uma parte para o próprio sustento.
As arrecadações, a partir daquele momento, passaram a ser mensais, segundo Fanini.
De acordo com Fanini, o dinheiro era deixado por intermediadores no
banheiro de uma sala da Superintendência de Desenvolvimento Educacional
(Sude) e depois levado para a casa dele, onde permanecia guardado até
ordem do governador. Quando exigidos, os valores eram repassados a Luiz
Abi.
Um dos maiores colaboradores do caixa 2, de acordo com o ex-diretor,
era Eduardo Lopes de Souza, dono da construtora Valor, a quem foi
apresentado por Valdir Rossoni (PSDB), que atualmente é deputado
federal.
A construtora Valor é apontada pelo Ministério Público do Paraná
(MP-PR) como pivô dos desvios de mais de R$ 20 milhões de obras de
construção de reforma de escolas estaduais, entre 2011 e 2015.
O crime ocorria mediante o pagamento de recursos por medições
fraudulentas feitas pelos fiscais de obra, segundo a investigações da
Operação Quadro Negro.
Outras empresas com contratos com a Secretaria Estadual de Educação
também contribuíram para abastecer o caixa 2, diz o ex-diretor.
Reeleição
Os repasses seguiram normalmente até um domingo chuvoso de abril de
2014, relata Fanini, quando ele diz ter sido convidado pelo governador
para uma partida de tênis.
Segundo ele, Richa pediu mais dinheiro para a campanha de reeleição.
Eduardo Lopes de Souza, da Valor, mais uma vez foi o principal
colaborador, relata Fanini. O empresário entregou R$ 250 mil em troca da
antecipação de faturas das obras de escolas, “pois ganharia tempo para
construir”.
O valor foi recebido por Fanini e, segundo ele, entregue ao empresário
Jorge Theodócio Atherino, da RF Participações, homem escolhido pelo
governo para receber as colaborações para a campanha de 2014.
Beto Richa foi de fato reeleito e, para comemorar, convidou Fanini,
Atherino e outros empresários para uma viagem de 20 dias aos Estados
Unidos e ao Caribe, de acordo com o ex-diretor da Educação.
Fanini conta que, em um fim de semana de janeiro de 2015, ele e Richa
foram ao balneário de Caiobá, no litoral paranaense, acompanhados pelas
esposas.
Em uma caminhada na areia da praia, diz o ex-diretor, o governador
pediu que as arrecadações junto aos empresários continuassem para
abastecer três campanhas nas eleições de 2018: a dele, para o Senado, do
irmão, Pepe Richa, para deputado federal, e do filho Marcello, para
deputado estadual.
m
depoimento à Justiça Estadual, o empresário Eduardo Lopes de Souza
afirmou que, em 2015, fez três repasses de R$ 100 mil para cada uma das
três campanhas citadas por Fanini.
Eduardo Lopes tem acordo de delação premiada, homologado pelo Supremo
Tribunal Federal (STF) no âmbito da Operação Quadro Negro.
Afastamento e mesadas
Maurício Fanini afirma que as primeiras denúncias do esquema de fraude
na construção de escolas surgiram em 2015, quando o Ministério Público
do Paraná pediu esclarecimentos à Secretaria de Educação após receber
denúncia anônima.
Fanini diz que falou ao governador e ao então secretário estadual de
Comunicação Deonilson Roldo sobre a investigação do MP-PR e, daquele
momento em diante, os dois passaram a “escanteá-lo”.
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O ex-diretor diz que, logo após ser denunciado pelos procuradores
estaduais pela Operação Quadro Negro, foi ao Palácio das Araucárias –
prédio do governo do estado – para tentar falar com o governador.
Ele conta que se deparou com Richa desesperado, apagando fotografias e mensagens do celular.
Dois meses depois, Fanini diz ter sido avisado pelo procurador Sérgio
Botto de Lacerda de que seria preso – como de fato foi, em 21 de julho.
O ex-diretor afirma que, depois da libertação, já exonerado do governo,
procurou de novo o governador dizendo que não poderia ficar sem
salário. Richa, então, ainda conforme Fanini, indicou dois nomes para
auxiliá-lo: Beto Freire, dono da empresa Rocha Top, e Jorge Atherino, da
RF Participações.
Ao procurá-los, Fanini relata que passou a receber R$ 12 mil por mês
como “forma de mesada para que permanecesse em silêncio” até o início de
2017, quando o valor caiu para R$ 8 mil.
Ele diz que explicava que não queria dinheiro, mas um novo emprego, e
ouviu “inúmeras promessas de atividade profissional” que não eram
cumpridas. Para ele, era uma tentativa de Atherino e Richa para tê-lo
“na mão”.
Fanini foi preso novamente em 16 setembro de 2017,
no apartamento dele, no bairro Cabral, em Curitiba, depois de virar réu
pelo crime de lavagem de dinheiro. Por segurança, foi transferido para
Brasília no fim de fevereiro.
O que dizem os citados
Beto Richa
"A
proposta de acordo de colaboração premiada de Maurício Fanini ainda se
encontra sob sigilo e mais uma vez foi vazada criminosamente.
Esta
forma ilícita de agir parece ser uma manobra arquitetada às vésperas do
período eleitoral, na tentativa de nivelar todos os políticos por
baixo.
Não
faço parte desta cena deplorável, onde criminosos confessos buscam
envolver pessoas inocentes em crimes que somente eles praticaram.
O
que esses criminosos pretendem? Ora, a resposta é muito simples!
Pretendem conseguir a redução das penas a que certamente serão
condenados pelos crimes cometidos e já confessados à Justiça, mesmo que
para isso tenham que envolver pessoas honestas.
No
caso de Maurício Fanini, a condenação pelos crimes praticados e por ele
próprio confessados chegará a 50 (CINQUENTA) anos de prisão !
Portanto,
está mais do que explicado porque Fanini tenta delatar tudo e todos,
sem, no entanto, apresentar quaisquer indícios de provas.
Qual
a razão de dar credibilidade a um criminoso que realizou 870 depósitos
em dinheiro vivo, em sua própria conta corrente, pagou cartões de
crédito em dinheiro vivo e formou um patrimônio incompatível com sua
renda?
É
uma tentativa desesperada de delação, que pela ausência de provas, não
será aceita pela Justiça. São acusações criminosas, com o objetivo de
envolver pessoas inocentes, retirando o foco das fraudes por ele
cometidas.
E para isso, mente descaradamente. Nem eu, nem qualquer membro da minha família, recebeu dinheiro desviado dos cofres públicos.
A
compra do apartamento do meu filho Marcello foi realizada de forma
regular, com recursos próprios e transferência bancária, sem a
utilização de dinheiro vivo, o que foi esclarecido também pelo vendedor
do apartamento, que foi ouvido duas vezes pelo Ministério Público
Estadual.
Igualmente
é criminosa a afirmação de que minha mulher teria solicitado 1.000
dólares para uma viagem de meu filho André ao Peru. Quem nos conhece
sabe que não precisamos disso e a afirmação beira o absurdo.
Repito:
é uma delação criminosa, sem provas, que busca apenas confundir as
pessoas. Espero que a Justiça apure e esclareça rapidamente essa
questão, para que os culpados sejam punidos de forma exemplar."
Luiz Abi
A defesa de Luiz Abi afirmou que todas as menções ao seu cliente são
mentirosas e que o único objetivo de Maurício Fanini é firmar um acordo
de colaboração premiada com o Ministério Público, envolvendo o máximo de
pessoas próximas ao ex-governador Beto Richa. Também disse que Fanini
tenta se isentar da responsabilidade dos crimes que ele cometeu e foram
comprovados pela Justiça.
O outro advogado de Abi, que cuida do processo sobre a licitação das oficinas, afirmou que não vai comentar a citação.
Sérgio Botto de Lacerda
Por telefone, o procurador Sérgio Botto de Lacerda afirmou que já
esclareceu tudo ao Ministério Público do Paraná. Botto de Lacerda negou
todas as afirmações feitas por Fanini. Ressaltou que não estava em
Curitiba na data citada por Fanini como o dia que teria antecipado sua
prisão e pedido para apagar supostas provas.
Botto de Lacerda afirmou ainda que realmente o avisou da demissão em
razão da secretária de Educação na época não ter conseguido fazer.
Afirmou que o conheceu neste dia e que Fanini o procurou algumas vezes,
tentando falar com o governador. O procurador afirmou que pediu não mais
o procurasse.
Ezequias Moreira
Ezequias Moreira, ex-secretário de governo, diz que desmente as
afirmações de Mauricio Fanini garantindo que nunca tratou com ele ou
qualquer outra pessoa sobre doações eleitorais. Afirma ainda que jamais
recebeu ou mandou que senhor Mauricio Fanini entregasse a qualquer
pessoa dinheiro ilícito. Diz ainda que Mauricio Fanini é um mentiroso,
que fraudou licitações, superfaturou obras, roubou o Erário Público e
agora quer terceirizar suas atitudes inescrupulosas e criminosas com o
único intuito de buscar uma redução de pena. Ezequias assegura sua
inocência e que processará Fanini por falsas acusações.
Finalmente, rechaça veementemente também falsas e levianas acusações de
interferência do ex-governador Beto Richa em seu julgamento.
Jorge Atherino
Por telefone, a defesa de Jorge Atherino afirmou que ele está a
disposição das autoridades. Informou que já prestou esclarecimentos ao
Ministério Público do Paraná, mas como está em sigilo, prefere não se
manifestar mais a respeito.
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Marcello Richa
O presidente do Instituto Teotônio Vilela do Paraná, Marcello Richa,
afirma que as suposições de Maurício Fanini são inverídicas e ressalta
possuir toda a documentação referente à compra do seu apartamento,
comprovando a legalidade e origens dos recursos. Rechaça qualquer
citação referente a recebimento de valores para uma possível campanha e
que o senhor Maurício, que é um criminoso confesso, tenta se beneficiar
da delação premiada para amenizar sua pena com afirmações mentirosas e
desprovidas de provas.
Pepe Richa
O ex-secretário Pepe Richa nega as afirmações de Mauricio Fanini que de
forma mentirosa quer terceirizar suas atitudes criminosas.
Deonilson Roldo
Deonilson Roldo diz que Fanini mente e que, quando descobriu indícios
de irregularidades em obras da antiga Sude, entre fevereiro e março de
2015, adotou todas as providências cabíveis para investigar e
responsabilizar os envolvidos nessas ilicitudes. Isso é de conhecimento
público e já foi informado inclusive ao Ministério Público, diz ele.
Eron Cunha
O empresário Eron Cunha, da Empo Engenharia, informa que não tem e
nunca teve qualquer atuação e interesse nas obras investigadas na
Operação Quadro Negro, e que desconhece o conteúdo de qualquer afirmação
feita pelo investigado ao Ministério Público.
O G1 tenta contato com os outros citados na reportagem.
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