By: INTERVALO DA NOTICIAS
Texto: BANDA B – Imagem: Divulgação Era dia 11 de janeiro de 2018, o então deputado Jair
Bolsonaro expunha queixas sobre reportagem do jornal Folha de S.Paulo
publicada quatro dias antes e que mostrava a evolução patrimonial dele e
de seus filhos políticos. “Você [repórter] tem que divulgar é o meu
patrimônio. Esquece meus filhos.”
A reportagem principal mostrava como a família do
presidente havia acumulado patrimônio ao longo de sua carreira política.
Um texto à parte foi dedicado ao senador Flávio Bolsonaro
(Republicanos-RJ), o filho 01, cujas 19 operações imobiliárias
despertaram mais atenção.
Nessa reportagem já estavam descritas as transações
relâmpagos em que o filho do presidente lucrou R$ 813 mil e, de acordo
com o Ministério Público do Rio de Janeiro, lavou R$ 638 mil.
À época não se sabia,
mas os textos publicados em 7 de janeiro de 2018 pela Folha de S.Paulo
poderiam guardar relação com um documento entregue quatro dias antes ao
MP-RJ: o relatório do Coaf que descrevia as movimentações financeiras
suspeitas do policial militar aposentado Fabrício Queiroz, amigo de
Bolsonaro e uma espécie de chefe de gabinete de Flávio na Assembleia
Legislativa do Rio.
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Os “rolos” com imóveis de Flávio chegaram oficialmente ao conhecimento
do MP-RJ em 6 de fevereiro de 2018, quando um advogado protocolou uma
notícia-crime com base nas reportagens.
A primeira diligência do Gaocrim (Grupo de Atribuição
Originária Criminal) foi pedir explicações ao senador. Ele afirmou que
os imóveis estavam em péssimo estado quando adquiridos e se valorizaram
depois em razão da Copa do Mundo de 2014, no Brasil.
O grupo, que estava com
o relatório sobre Queiroz em mãos, arquivou em maio daquele ano o
procedimento sobre os imóveis, após as explicações. Ignorou o fato de
que as transações imobiliárias se encaixavam nos critérios de suspeita
do mesmo Coaf, o órgão federal de inteligência financeira.
Por quase um ano, o desejo de Bolsonaro se concretizou. O
patrimônio de Flávio repousou nos arquivos do MP-RJ, e a investigação
sobre Queiroz andou a passos lentos.
O procedimento sobre os imóveis só foi desarquivado em
fevereiro de 2019. Foram necessários mais de 13 meses para que os dois
casos fossem relacionados.
O MP-RJ agora acusa Flávio de ter recolhido o salário de
funcionários e, com dinheiro vivo, pago “por fora” valores pela compra
dos imóveis a fim de lavar o dinheiro ilegal.
Dados da quebra de sigilo bancário autorizada pelo juiz
Flávio Itabaiana em abril de 2019 deram indícios sobre as razões do
apelo de Bolsonaro 15 meses antes. Em razão da amplitude da medida, foi
possível verificar que os hábitos financeiros exóticos não se
restringiam aos assessores de Flávio.
A personal trainer Nathália Queiroz manteve a transferência de 80% de
seu salário para o pai, Queiroz, mesmo quando esteve empregada no
gabinete de Jair Bolsonaro na Câmara. Um funcionário de Carlos também
sacava quase todo o seu salário, revelou o jornal O Globo.
Há ainda os cheques de R$ 89 mil da família Queiroz nas
contas da primeira-dama, Michelle Bolsonaro, cuja razão ainda não foi
esclarecida.
Naquele janeiro de 2018, em Angra, Bolsonaro expôs como
os gabinetes da família eram, na verdade, um só. “Não há diferença.
Quando um funcionário trabalha para mim, trabalha para os dois também”,
disse Bolsonaro, em referência a Flávio e Carlos, com base eleitoral no
Rio de Janeiro.
Aos poucos, as investigações revelaram o uso intenso de
dinheiro vivo no pagamento de despesas pessoais de Flávio e investimento
em imóveis. A suspeita é de que seja dinheiro da “rachadinha”.
Reportagens do jornal O Globo apontam uso de dinheiro vivo na aquisição de imóveis pela família Bolsonaro ao longo dos anos.
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As escrituras das transações apontam que o pagamento
ocorreu “em moeda corrente, contada e achada certa”, expressão que
costuma ser usada para quitação com recursos em espécie.
A Folha de S.Paulo questionou o presidente naquela
entrevista sobre a existência da expressão em uma de suas escrituras.
Ele disse que nunca havia pago imóvel em dinheiro.
“Levar em dinheiro e pagar? Geralmente é DOC. Levar em
dinheiro não é o caso. Poder ser roubado. Tira do banco direto e manda
para lá. Eu não guardo dinheiro no colchão em casa”, disse.
O vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) declarou ter R$ 20 mil em dinheiro em espécie.
A casa em que Bolsonaro vivia também se enquadra nas características de
transação suspeita do Coaf. O presidente comprou a casa em janeiro de
2009 por R$ 400 mil de uma empresa que havia pago R$ 580 mil quatro
meses antes.
A Procuradoria-Geral da República abriu em 2015 um
procedimento sobre o patrimônio de Bolsonaro após uma denúncia anônima.
Ela foi arquivada sem analisar a variação incomum de preço do imóvel num
intervalo de quatro meses.
A movimentação financeira da família do presidente tem ainda uma série de fatos ainda sem explicação e vinculação clara.
O investimento em imóveis pela família se intensificou a
partir de 2008, ano em que o presidente se separou da advogada Ana
Cristina Valle.
O litígio do casal chegou à polícia, onde a ex-mulher de
Bolsonaro acusou o ex-marido de furtar pertences de um cofre particular
que mantinha no Banco do Brasil com, segundo ela, R$ 200 mil e US$ 30
mil em espécie.
Nas eleições de 2018, quando se candidatou sem sucesso a deputada federal, a advogada negou as acusações que tinha feito.
Valle foi chefe de gabinete de Carlos Bolsonaro por oito
anos na Câmara Municipal. O vereador, investigado sob suspeita de
empregar funcionários fantasmas, também manteve um cofre particular no
Banco do Brasil.
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Também foram indícios de existência de funcionário
fantasma que levaram a Folha de S.Paulo ir a Angra dos Reis, em janeiro
de 2018, onde encontraram de surpresa o então deputado para entrevista.
Walderice da Conceição, a Wal do Açaí, é investigada há
mais de dois anos em razão do caso. Enquanto isso, busca uma vaga na
Câmara Municipal de Angra com apoio explícito e o sobrenome do
presidente.
Até o momento, a denúncia apresentada pelo MP-RJ mostra
uma versão de supostos crimes cometidos apenas no gabinete de Flávio. O
cenário total sobre a atuação da família só poderá ser desenhado quando e
se as investigações atingirem toda família, seguindo a lógica do
presidente de um gabinete único familiar.
Os órgãos de controle perderam
essa oportunidade no passado. O presidente só pode ser investigado por
crimes cometidos no exercício do cargo. Serão necessários mais dois ou
seis anos –caso Bolsonaro seja reeleito– para que os investigadores,
agora, não se esqueçam do pai.
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