By: INTERVALO DA NOTICIAS
Texto: NAPOLEÃO ALMEILDA (UOL) – Imagem: Divulgação
Você
conhece aquela parábola do jogador que bate escanteio e corre cabecear? O
famoso faz-tudo, pau pra toda obra, se vira nos 30? No Paraná, ela é real.
Donizete
Gomes dos Santos, o Doni, é goleiro do Iraty, clube da segunda divisão
estadual. O time bateu na trave na luta pelo acesso à elite paranaense, mas
certamente não por falta de esforço de Doni. Além de goleiro, ele trabalha numa
empresa de coleta de lixo reciclável em Irati, cidade de 60 mil habitantes a
150 km de Curitiba. Em duas das partidas da campanha que deixou o Azulão na
terceira posição geral, a uma do acesso, o goleiro estava catando lixo antes de
ir defender as bolas chutadas contra o seu gol.
"É,
realmente é verdade. Eu, além de jogar futebol, trabalho num centro de
reciclagem. Já há algum tempo que eu venho trabalhando nesse centro de
reciclagem para poder sobreviver", contou. A rotina é puxada. "Pego
cedo, levo as crianças para a escola e vou para a reciclagem. Fico até 15h,
15h30 e vou treinar", conta. Contra o Operário, clube campeão da elite
estadual em 2015 e que atualmente disputa a Série D do Brasileiro, Doni fechou
o gol.
"Eu
naquele dia trabalhei na reciclagem até as 15h, cheguei em casa correndo, tomei
um banho e desci pro clube. Pegamos o ônibus e fui jogar", relembra, sobre
a partida que terminou 3 a 2 para seu time. O Operário de Ponta Grossa, cidade
100 km distante de Irati, é um dos clubes mais tradicionais do Paraná. Embora
esteja na segunda divisão local, eliminou a Desportiva Capixaba-ES e está a
quatro jogos do acesso para a Série C nacional. Diante do Iraty, em duas
ocasiões, parou em Doni e vai amargar mais um ano na segunda divisão do Paraná.
Não
foi a única nem a primeira vez em que Doni fez isso. "Contra a Portuguesa
Londrinense a gente tinha viagem logo cedo e pintou um trabalho para montar e
desmontar um palco de um show aqui na cidade", conta, "Então nós
começamos a montagem a noite e fiquei até as seis da manhã desmontando. Tomei
um banho e entrei no ônibus pra ir jogar". Foram cinco horas e meia de viagem
e um placar de 3 a 0 a favor, com boa atuação.
Natural
de Prudentópolis, cidade vizinha a Irati – e também onde começou Alex Muralha,
goleiro do Flamengo – Doni está com 26 anos. Fez testes no Atlético-PR, no São
Paulo, rodou por Mato Grosso, Minas Gerais e voltou ao Paraná. Além de jogador
profissional, é federado como árbitro de futsal e de futebol em jogos dos times
amadores da Federação Paranaense. Cata e recicla lixo, apita jogos amadores e
tenta evitar gols para conseguir pagar as contas.
"O
salário de jogador não dá", diz, referindo-se aos pouco mais de R$ 1.000
que tem como vencimentos. "Ano passado se trabalhou pela renda. Nesse ano
por salários, que estão atrasados. O Iraty está recomeçando. A família da minha
mulher começou a trabalhar com lixo reciclado, em 2012. Eu trabalho para
sustentar minha família. O ganho é pouco. Tem mais gente com a gente, então não
é muito, mas é para poder manter a casa, os filhos"
"Muita
gente pensa que jogador de futebol ganha horrores de dinheiro. Realmente, na
Série A, na Europa, ganha. Mas nós que estamos ainda lutando por um lugar ao
sol, era um pouco mais de R$ 1.000, e ainda estava atrasado". O Paranaense
da segunda divisão chegou ao fim com o Maringá campeão. O Iraty de Doni foi
eliminado na segunda fase. União, de Francisco Beltrão, e Maringá, vão estar na
elite em 2018, contra Atlético-PR e Coritiba, entre outros.
Doni, porém, só voltará a jogar em 2017 se arrumar
outro clube. Sem calendário, o Iraty não joga até o começo da segunda divisão
do ano que vem, por volta de abril. Isso se o clube mantiver as atividades.
Senão, Doni terá que se reciclar profissionalmente, outra vez.
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